História 38

Saci em Sorocaba

Tenho uma vaga lembrança de que foi publicado em algum jornal que a justificativa para a não aceitação da lei que instituia o Dia do Saci em Sorocaba era o fato do "Saci não ser um mito sorocabano...".

Estou citando de memória, pelo que peço desculpas se houver algum equívoco; mas, por outro lado, penso que em essência foi isso mesmo o que ocorreu. Não sei no que se baseou tal justificativa, mas seria o caso de se perguntar: o Saci é um desconhecido em Sorocaba?

Retrocedamos ao ano de 1917... Nesse ano, Monteiro Lobato publicava - embora seu nome não figurasse na capa - o livro "O Sacy Pererê - Resultado de um Inquérito", no qual figura o depoimento do sr. Luiz Fleury, de Sorocaba, nas páginas 177 e seguintes. Um depoimento oriundo de Sorocaba na mais importante obra sobre o Saci! Lá está a descrição de Luiz Fleury para o mito, ouvido por ele de uma certa Nhá Rolinha: "Negrinho de um metro de altura, mais ou menos, com uma perna só e pé em forma de casco de carneiro" (p. 183).

Alguns anos depois, o poeta sorocabano Hilário Correa publicou, no jornal "Correio de Sorocaba" (02 de setembro de 1928) os seguintes versos:

O Sacy

Ao Amigo Ruy T. Barros

Noite cerrada. A matta está silente
Em casa todos dormem, menos eu
Desesperado chamo por Morpheu
Que não vem, nem me attende, o inclemente.
Eis que o silêncio esvae-se de repente
Escuto no terreiro um escarcéu
E põem-se os cães a uivar lugubremente
Fico curioso: - O que é qu’aconteceu?
Salto da cama, calço numa chinella,
Vou à cozinha; então abro a janella,
e vejo... Oh! Deus! Que coisa feia eu vi!
Brejeiro, assobiando: Fi! Fi! Fi!
Firmando num pé só sobre a cancella,
Estava o vulto horrendo dum Sacy...

Hylario Correa

No dia 19 de janeiro de 1935, durante a visita de Ferroviários à Fábrica Votorantim, entre a variedade do programa apresentado na ocasião, a menina Catharina Ribeiro leu o texto "O Sacy", demonstrando que o mesmo não era um estranho em Sorocaba.

O folclorista e escritor Waldemar Iglésias Fernandes, no início da década de 1970 publicou o livro "52 estórias populares (Sul de São Paulo - Sul de Minas)", tendo colhido a seguinte história de Saci em Sorocaba, ouvida por ele contada por Nhá Dita (Dona Benedita):

UMA DO SACI

Uma vez o Saci apareceu numa casa e 'garrou a fazer estripolias’, correndo dentro da casa e dando aqueles assobios de deixar todo mundo louco!

Daí quando ele foi embora e passou o susto, a mulher, dona da casa, que tinha criancinha nova, correu no berço e viu que a criança não estava ali!

Procurou na casa inteira e não achava onde estava a criança! Ela escutava o choro e não achava!

Por fim ela saiu no quintal e viu que o diabo do Saci tinha posto a criança dentro do tacho de sabão!

Ainda sorte que o sabão estava frio!

Mas, mesmo assim, quando essa criança ficou moço sempre ficou com umas marcas nas costas, que o sabão deixou nele!".

Ainda nos conta o jornalista Alcir Guedes, num texto que publicou no "Diário de Sorocaba", com o título "Saci em Sorocaba", que na época em que o poeta Ulisses Tavares trabalhava como repórter do referido "Diário de Sorocaba", foi até uma casa na rua São Vicente, Vila Santana, pois havia notícia de que uma pessoa prendera um saci no porão. Ulisses não viu nenhum Saci, mas afirmou que aquele porão era muito estranho e que "Havia, de fato, qualquer coisa sobrenatural naquele porão".

Então? Dá para afirmar que Saci é um mito desconhecido em Sorocaba?

01.02.2012
Carlos Carvalho Cavalheiro 

 

<< voltar