Saci em Sorocaba
Tenho uma vaga lembrança
de que foi publicado em algum jornal que a justificativa
para a não aceitação da lei que instituia o Dia do Saci
em Sorocaba era o fato do "Saci não ser um mito
sorocabano...".
Estou citando de memória, pelo que peço desculpas se
houver algum equívoco; mas, por outro lado, penso que em
essência foi isso mesmo o que ocorreu. Não sei no que se
baseou tal justificativa, mas seria o caso de se
perguntar: o Saci é um desconhecido em Sorocaba?
Retrocedamos ao ano de 1917... Nesse ano, Monteiro
Lobato publicava - embora seu nome não figurasse na capa
- o livro "O Sacy Pererê - Resultado de um Inquérito",
no qual figura o depoimento do sr. Luiz Fleury, de
Sorocaba, nas páginas 177 e seguintes. Um depoimento
oriundo de Sorocaba na mais importante obra sobre o
Saci! Lá está a descrição de Luiz Fleury para o mito,
ouvido por ele de uma certa Nhá Rolinha: "Negrinho de um
metro de altura, mais ou menos, com uma perna só e pé em
forma de casco de carneiro" (p. 183).
Alguns anos depois, o poeta sorocabano Hilário Correa
publicou, no jornal "Correio de Sorocaba" (02 de
setembro de 1928) os seguintes versos:
O Sacy
Ao Amigo Ruy T. Barros
Noite cerrada. A matta
está silente
Em casa todos dormem, menos eu
Desesperado chamo por Morpheu
Que não vem, nem me attende, o inclemente.
Eis que o silêncio esvae-se de repente
Escuto no terreiro um escarcéu
E põem-se os cães a uivar lugubremente
Fico curioso: - O que é qu’aconteceu?
Salto da cama, calço numa chinella,
Vou à cozinha; então abro a janella,
e vejo... Oh! Deus! Que coisa feia eu vi!
Brejeiro, assobiando: Fi! Fi! Fi!
Firmando num pé só sobre a cancella,
Estava o vulto horrendo dum Sacy...
Hylario Correa
No dia 19 de janeiro de
1935, durante a visita de Ferroviários à Fábrica
Votorantim, entre a variedade do programa apresentado na
ocasião, a menina Catharina Ribeiro leu o texto "O Sacy",
demonstrando que o mesmo não era um estranho em
Sorocaba.
O folclorista e escritor Waldemar Iglésias Fernandes, no
início da década de 1970 publicou o livro "52 estórias
populares (Sul de São Paulo - Sul de Minas)", tendo
colhido a seguinte história de Saci em Sorocaba, ouvida
por ele contada por Nhá Dita (Dona Benedita):
UMA DO SACI
Uma vez o Saci apareceu
numa casa e 'garrou a fazer estripolias’, correndo
dentro da casa e dando aqueles assobios de deixar todo
mundo louco!
Daí quando ele foi embora e passou o susto, a mulher,
dona da casa, que tinha criancinha nova, correu no berço
e viu que a criança não estava ali!
Procurou na casa inteira e não achava onde estava a
criança! Ela escutava o choro e não achava!
Por fim ela saiu no quintal e viu que o diabo do Saci
tinha posto a criança dentro do tacho de sabão!
Ainda sorte que o sabão estava frio!
Mas, mesmo assim, quando essa criança ficou moço sempre
ficou com umas marcas nas costas, que o sabão deixou
nele!".
Ainda nos conta o jornalista Alcir Guedes, num texto que
publicou no "Diário de Sorocaba", com o título "Saci em
Sorocaba", que na época em que o poeta Ulisses Tavares
trabalhava como repórter do referido "Diário de
Sorocaba", foi até uma casa na rua São Vicente, Vila
Santana, pois havia notícia de que uma pessoa prendera
um saci no porão. Ulisses não viu nenhum Saci, mas
afirmou que aquele porão era muito estranho e que
"Havia, de fato, qualquer coisa sobrenatural naquele
porão".
Então? Dá para afirmar que Saci é um mito desconhecido
em Sorocaba?
01.02.2012
Carlos Carvalho Cavalheiro
|